"A todos os visitantes de passagem por esse meu mundo em preto e branco lhes desejo um bom entretenimento, seja através de textos com alto teor poético, através das fotos de musas que emprestam suas belezas para compor esse espaço ou das notas da canção fascinante de Edith Piaf... Que nem vejam passar o tempo e que voltem nem que seja por um momento!"

31.5.13


Cansei. Tô cansada. 

cansei da pequena janela por onde se avista metades.
tô cansada de meio sorriso, meia vida, meia felicidade.
cansei dessa fresta por onde só passa meia porção.
tô cansada do pouco, da migalha, de ilusão.
cansei de reprimir minha ânsia por intensidade.
tô cansada de viver de mentirinha, fingindo que é de verdade.
cansei de doses lights, de achar que o pouco é suficiente.
tô cansada de querer acreditar que talvez eu nem seja assim tão exigente.
cansei de dizer que tá tudo bem, quando na verdade eu tô é farta.
cansei. tô cansada. tô repleta de tanta coisa que somada é quase nada.

Sandra Amélie

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30.5.13


Esta noite sonhei que era um rio. Um rio pequenino, é certo, que nada mais conhecia além das montanhas onde nascia, dos amieiros e dos juncos que nele se debruçavam. Como todos os rios, o que eu mais ardentemente desejava era desaguar. Comecei a perguntar onde ficava o mar, mas ninguém me sabia responder. Apontavam-me com um gesto vago ora o este ora o oeste. Escolhera já a forma de desaguar - em delta, claro - mas não recolhera ainda o menor indício da proximidade do mar. Uma noite em que estava acampado entre as dunas cheguei finalmente a uma conclusão (a mesma a que todos os rios chegaram talvez antes de mim): o mar não existia. 

 (E essa conclusão era salgada.)

  Jorge de Sousa Braga 

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29.5.13


 Sinto-me como se vivesse dentro de uma nuvem. Branca. Fecho os olhos e deixo-me arrastar. Pelo vento.

É imprevisível o destino de uma nuvem. Pode dar várias vezes a volta ao globo. Ou desfazer-se de encontro à montanha mais próxima. Mas isso em nada parece afectá-las. Afectar-me.

Vivo dentro de uma nuvem. Cujo destino é vaguear. E cujos limites é não haver limites.

  Jorge Sousa Braga

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28.5.13


(…)  e ele sabe que nunca se poderá sentar ali sozinho. em nenhum lugar, em nenhuma dimensão se poderá sentar sozinho. porque no perímetro de quem respira… porque o leito por onde corre a respiração de alguém, é que é o chão mais profundo de um ser. é o lugar indizível do seu próprio divino. um espaço que só a água do sonho consegue ocupar. fundo, muito fundo, tão fundo como a eternidade. e é aí que evoluem todos os seres do seu ser, desamarrados do tempo, soltos, demorados como demora o rasto do último beijo no coração de quem ainda perde o que um dia a estrada levou. 

  Gil T.Sousa

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27.5.13


Queria que me acompanhasses 

queria que me acompanhasses
vida fora
como uma vela
que me descobrisse o mundo
mas situo-me no lado incerto
onde bate o vento
e só te posso ensinar
nomes de árvores
cujo fruto se colhe numa próxima estação
por onde os comboios estendem
silvos aflitos

 Ana Paula Inácio 

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26.5.13


Amado meu

se as noites frias
apagarem nosso passado
saiba que ainda
há o que queimar

o fogo arde ainda
em meus olhos tardios
que anseiam os seus
tão vencidos

não desisto da falta de lirismo
na verdade a ausência
por vezes me inspira
aqui não perduram
declarações de amor

a insistência vive
apenas para buscar
o que encontramos
quando nos vestimos
de nós mesmos.

 Larissa Marques

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25.5.13


...apenas preciso de alguém que me sorria e reponha o mesmo disco sempre a tocar e escute comigo o vento nas janelas e sinta a tristeza que têm os gladíolos murchando em cima da mesa. 

  Al Berto

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24.5.13


Alma nova 

Não era a minha alma que queria ter.
Esta alma já feita, com seu toque de sofrimento
e de resignação, sem pureza nem afoiteza.
Queria ter uma altura nova.
Decidida capaz de tudo ousar.
Nunca esta que tanto conheço, compassiva, torturada
de trazer por casa.
A alma que eu queria e devia ter…
Era uma alma asselvajada, impoluta, nova, nova,
nova, nova!

 Irene Lisboa 

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23.5.13


Este choro que arranha e lava 

 Tirava os quadros da parede. Voltava a pendurá-los. Olhava. Mas quem lhe diz que visse. Repetia a mesma faixa do disco. Escutava. Mas quem lhe diz que ouvisse. Queria chegar a uma conclusão, isto podemos afirmar sem dúvida. Mas quem lhe diz que houvesse. E quem lhe diz que fizesse diferença haver ou não haver. E quem lhe diz que todo o caminho não fosse exatamente não chegar. Ninguém lhe diz. De fato, ninguém lhe diz. 

 Toda a vida tentara entender a vida, vivê-la como ideia que pudesse pensar. Só agora percebia que a vida era outra realidade. Uma brisa inesperada na face. Uma areia encravada sob a pálpebra. Nada que alguma vez tivesse pensado. Esta lágrima. Este choro que arranha e lava. 

  Jorge Roque 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

22.5.13


Canção

Se estou só, queres tu saber:
Pois bem, sim, estou só, 
como o avião que voa só e horizontal,
fixado no feixe de rádio, 
e atravessa as Montanhas Rochosas,
visando os corredores orlados de azul
de um qualquer aeroporto no oceano.

Se estou só, queres perguntar:
Bem, é claro, só
como uma mulher que atravessa de automóvel o país, 
dia após dia, deixando atrás de si,
milha após milha,
cidadezinhas onde podia ter parado
e vivido e morrido em solidão.

Se estou só,
deve ser a solidão
de ser a primeira a despertar, de respirar
o primeiro sopro frio da manhã sobre a cidade,
de ser a única acordada
numa casa envolta em sono.

Se estou só,
é com o barco a remos bloqueado na margem pelo gelo
na derradeira luz vermelha do ano,
e que sabe o que é, que sabe não ser
gelo, nem lama, nem luz de Inverno,
mas madeira, dotada para arder.

 Adrienne Rich

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21.5.13


Amanhã vou pintar o cabelo, decide. Porque no amanhã de certos dias pinta sempre o cabelo ou compra um batom diferente, mais claro, mais escuro, incolor, pinta os olhos ou ignora-os, usa ou não óculos escuros. Há ocasiões em que a encontram, hesitam, será ela?, devem pensar. “Meu Deus, estás diferente, que te aconteceu, mulher?” Apetece-lhe responder que morreu e ressuscitou, que estava na idade dos peixes e houve um cataclismo e se encontra agora na dos lagartos, mas ninguém iria compreender as suas palavras. Nem ela própria. Porque além da cor do cabelo, ou do lápis com que pintou os olhos, tudo está absolutamente igual. 

  Maria Judite de Carvalho

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20.5.13


Rubro 

na sagrada mesa a taça de rubro vinho
que sorverei num momento
o sabor em tormento teu
o fervor, lamento meu
na sagrada mesa
a taça que
sorverei
momento
teu.
o fervor,
lamento
meu.

 Mirze Souza 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

19.5.13


Assim passam os anos

Passam os anos,
e mesmo que a vida me acuse de imobilidade,
também eu viajei.
Como uma partícula de pó
percorri a casa e e prendi-me aos livros.
Como um insecto repousei na borda dos açudes,
ou simplesmente fui uma mulher que de tarde em tarde
olhou para o mar
procurando barcos esquecidos pela neblina
e que voltam à memória
sem esperança diferente da noite.

 Lauren Mendinueta 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

18.5.13


Trago, em algum lugar dentro de mim, a certeza de que nos encontraremos de novo. Isto está muito claro prá mim. Vamos nos encontrar nos mesmos lugares onde estivemos. Vamos rever pessoas, paisagens, sentir de novo o gosto do café expresso, da água de coco. Além de reviver tudo, vamos recuperar o tempo que passamos separados. Sim, pois tudo foi aprendizado. Já não erraremos mais do mesmo modo. Não cometeremos as mesmas faltas, não padeceremos das mesmas solidões e nem nos imputaremos as mesmas indelicadezas. Este tempo de agora nos fortalecerá... é como um caminho de exílio, no qual amadurecemos. Por enquanto limito-me a fechar os olhos e pensar em você. Mas aqui dentro, em algum lugar que só enxergo de olhos fechados, sei que nos encontraremos de novo.

 (Sabe aquele banco lá no parque? Aquele, que um dia vimos um casal de velhinhos sentados, de mãos dadas? Lembra o que você disse? “Somos nós, daqui a mais alguns anos...” 

 Não chegamos a ser. Mas o banco ainda está lá, e eu passo por ele todos os dias. 

  mdalva 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

17.5.13


Em preto e branco
 
 Insisto que um dia partirei de trem; nunca, nunca de avião, nunca de ônibus, nunca de táxi. Partirei como nos filmes antigos: na estação ferroviária, em pleno inverno, com sobretudo e chapéu de plumas. Entrarei na minha cabine e fumarei um cigarro, enquanto espero o cavaleiro à minha frente. Sonharei forte, como só se sonha na década de 50, com o trem apitando em preto e branco. 

  Aeronauta

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16.5.13


A dor é uma coisa muito esquisita; ficamos tão desamparados diante dela. É como uma janela que simplesmente se abre conforme seu próprio capricho. O aposento fica frio e nada podemos fazer senão tremer. Mas abre-se menos cada vez, e menos ainda. E um dia nos espantamos porque ela se foi.

  Arthur Golden

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15.5.13


Despedindo-se do passado

Ela vai no banco de trás do carro, com as mãos no rosto, pois não quer ver para onde vai. Deixou tudo para trás e está indo para onde a vida quiser levá-la. Está querendo encontrar uma saída para se livrar de tudo o que está acontecendo em sua vida. Todos foram embora e a deixaram. É a vez dela ir embora e deixar tudo para trás. 

  Vanessa Carvalho 

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14.5.13


 

há traços no rosto
traços de pensamentos,
abarcados à saudade.

há um olhar baço
de um quadro com tons verdejantes,
reste-as de tempos passados.

há  vozes que se perderam,
um verbo por conjugar,
no cansaço que quem amou e chorou.

há abraços desabitados,
lamentos diluídos…
no âmago da existência.

há o canto num peito naufragado
em caminhos divergentes…

Helena Maltez

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13.5.13


Retratos

Retratos molhados de pranto
Desnudam com propriedades
Amores que a vida descartou
Nas estradas abandonadas

Empoeirados em um canto
Deteriorados pelo tempo
Mostram risos tristonhos
Restos dos muitos sonhos

Como confetes espalhados
Cada qual foi para um lado
Sobraram apenas imagens
Angustiantes paisagens

Sobre antigos aparadores
Pranteiam rostos perdidos
Existenciais desencontros
Escombros na dor vencidos.

 Ana Maria Stoppa

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12.5.13


Relíquia 

Era de minha mãe: é um pobre xale,
que tem p'ra mim uma carícia de asa.
Vou-lhe pedir ainda que me fale
da que ele agasalhou em nossa casa.

Na sua trama, já puída e lassa,
deixo os meus dedos p'ra senti-la ainda;
e Ela vem, é Ela que me abraça,
fala de coisas que a saudade alinda.

É a minha mãe mais perto, mais pertinho,
que eu sinto quando toco o velho xale,
que guarda não sei quê do seu carinho.

E quando a vida mais me dói, no escuro,
sinto ao tocá-la como alguém que embale
e beije a minha sede de amor puro.

António Patrício

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11.5.13


Momentos 

Finjo que estás
presente... e me habitas,
como quem sente
esta saudade
em mim...

Finjo que me
abraças... e me envolves,
como quem sonha
um arco-iris
distante...

Finjo que não sei,
o que já sei,
só não finjo
esta saudade
que me habita e me envolve!

Luz Lopes 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

10.5.13


Poema da tarde

A tarde move-se entre os galhos de minhas mãos.
Uma estrela aparece no fim deste meu sangue,
Minha nuca recebeu o hálito fino de uma rosa branca.
Todas as formas servem-se mutuamente,
Umas em pé, outras se ajoelhando, outras sentadas,
Regando o coração e a cabeça do homem:

E dentre os primeiros véus surge Maria da Saudade
Que, sem querer, canta.

Murilo Mendes

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9.5.13


Desencontro

Não sei
que gostaria de fazer, 
quem gostaria de encontrar. 

Sei
que não tenho para onde ir, 
e que onde estou
não me encontro...

J. G. de Araujo Jorge 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

8.5.13


Impressão Digital 

Após todos os fins
nasço: 

nos escombros do muro, 
das torres, 
do mundo. 

Eu, 
rascunho permanente, 
de um já escrito
epitáfio.

 Astier Basílio

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7.5.13


De passos leves 

Saí sem destino...
atravessei a porta que me trancava
e fechei os olhos para não escolher caminhos...
De nada careço.
Não sei o que me leva.
Não sei o que me busca.

Minha bagagem é quase nenhuma...
Sonhos abandonados não pesam...
Passos escassos.
Pouca demora.
Breve estadia...

 Sonia Pallone

¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

6.5.13


Soltava um suspiro de desdém toda manhã antes de enfrentar a vida. Tinha sede de viver, mas tinha fome de desistir. Viu a magia de ser várias vezes por perto, mas nunca com ela. Achava a vida uma coisa tão sem graça, e era tão atormentada a ponto de perder-se na estrada. Agora dilui os tormentos em água e joga no mar, vive na areia e guarda-se no céu. 

  (desconheço autoria) 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

5.5.13


 Um dia não dançou
O som perdeu-se, o sorriso era uma sombra
nas muralhas que se lançavam em cada onda.
Apenas a melodia no cair da noite, eco em cada sonho,
o sonho do rodopiar.
Rodopiar um passado, sem presente.
Descalça
Passos
Sapatilhas
Fios, soltos
Mãos sem gestos
Pés nus
Sem dança.

 Maria P.

¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

4.5.13


Depois do beijo 

Adormeceste?
Não, dizes.

Flores em Maio
Florindo ao meio-dia.

Na relva junto ao lago,
Ao sol,

Podia fechar os meus olhos
E morrer aqui, dizes.

 Miki Rofu
(trad. José Alberto Oliveira)

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

3.5.13


Coberta 

Não preciso de atavios,
de jóias, de elogios.
Não preciso do sol,
da lua, do canto da cotovia.
Não preciso das sedas
nem do perfume da rosa.
Não preciso de nada –
só de minha nudez
e do teu desejo: teu corpo
é a coberta que almejo.

 Giselda Penteado Di Guglielmo 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

2.5.13


Adágio medieval 

Venho não sei de onde,
Sou não sei quem,
Morro não sei quando,
Vou não sei onde,
Espanto-me de ser tão alegre.

 Martinus von Biberach 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

1.5.13


Elegia 

Entrou na sala e ficou em pé tocando piano,
Sua mão pequena batia no teclado duramente.
Lembro que estava de vermelho
Lembro que tinha nas tranças finas uma fita preta
Lembro que era de tarde
E entrava pelas janelas abertas o vento do mar.
Não lembro se tinha flores perto dela
Mas nascia um perfume do seu corpo.

Que amor o meu!

 Augusto Frederico Schmidt 

 ¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨