"A todos os visitantes de passagem por esse meu mundo em preto e branco lhes desejo um bom entretenimento, seja através de textos com alto teor poético, através das fotos de musas que emprestam suas belezas para compor esse espaço ou das notas da canção fascinante de Edith Piaf... Que nem vejam passar o tempo e que voltem nem que seja por um momento!"

31.3.12



Palavras e silêncios dentro de mim

Deram-me o silêncio para eu guardar dentro de mim
(...)
Deram-me o silêncio como uma palavra impossível,
(...)
Para eu guardar dentro de mim,
Para eu ignorar dentro de mim
A única palavra sem disfarce
(...)

Adolfo Casais Monteiro

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28.3.12



recaída

nada mudou. caminho em círculos.
à mais efémera alegria
sobrevirá já que o persigo
o caos talvez nas manhãs frias

do outono inexistente e azul
ou nas notas falsas de um blues

nordestinado ao som da lua
cheia. mentiras de poeta.
perdida há muito em meio à bruma

desaprendi de ver. de crer.
de chorar? não. e de morrer?

Márcia Maia

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25.3.12



O primeiro amor

Dizem
que o primeiro amor é o mais importante.
É muito romântico,
mas não é o meu caso.

Algo entre nós houve e não houve,
deu-se e perdeu-se.

Não me tremem as mãos
quando encontro pequenas lembranças,
aquele maço de cartas atadas com um cordel,
se ao menos fosse uma fita.

O nosso único encontro, passados anos,
foi uma conversa de duas cadeiras
junto a uma mesa fria.

Outros amores
continuam até hoje a respirar dentro de mim.
A este falta fôlego para suspirar.

No entanto, sendo como é,
não lembrado,
nem sequer sonhado,
consegue o que os outros não conseguem:
acostuma-me com a morte.

Wislawa Szymborska

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23.3.12



Diz-me por favor onde não estás
em qual lugar posso não te ver,
onde posso dormir sem te lembrar
e onde relembrar sem que me doa.

Diz-me por favor onde posso caminhar
sem encontrar as tuas pegadas,
onde posso correr sem que te veja
e onde descansar com a minha tristeza.

Diz-me por favor qual é o céu
que não tem o calor do teu olhar
e qual é o sol que tem luz apenas
e não a sensação de que me chamas.

Diz-me por favor qual é o lugar
em que não deixaste a tua presença.
Diz-me por favor onde no meu travesseiro
não tem escondida uma lembrança tua.

Diz-me por favor qual é a noite
em que não virás velar meus sonhos.
Que não posso viver porque te espero
e não posso morrer porque te amo.

Jorge Luis Borges

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20.3.12



Com os anos a morte vai-se tornando familiar. Quero dizer não a ideia da morte, não o medo da morte: a realidade dela. As pessoas de quem gostamos e partiram amputam-nos cruelmente de partes vivas nossas, e a sua falta obriga-nos a coxear por dentro. Parece que sobrevivemos não aos outros mas a nós mesmos, e observamos o nosso passado como uma coisa alheia: os episódios dissolvem-se a pouco e pouco, as memórias esbatem-se, o que fomos não nos diz respeito, o que somos estreita-se. A amplidão do futuro de outrora resume-se a um presente acanhado.

António Lobo Antunes

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18.3.12



Quero te dar um vestido com um desenho que ainda
não sei como será
Penso frutas, dragões, sereias
Fantasias que nem ainda sei bordar
Mas quero te dar um vestido, quem sabe de areia
Quem sabe de uma linha que não se saiba coser
Penso te dar um vestido bordado de ambos os lados
do querer
Nem te quero vestir
Nem quero que o vejas nem que o queiras talvez
quero te dar um vestido que a minha alma deseja

José Carlos Capinan

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17.3.12



...

Estava capaz de fazer chá e tomar vitamina C.
Apetece-te uma chávena de chá?

Estava capaz de ficar muito sossegadinho a um canto,
parando de inventar motivos
para andar de um lado para outro.

Estava capaz de ter uma conversa contigo.
Apetece-te uma conversa?

Sam Shepard

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16.3.12



amanhã vou afundar-me no outono
passar para além do reflexo do espelho
a palavra que se dissolve na respiração

onde está o coração? é como metáfora do
silêncio que ocupa o teu lugar

e eu estou no meio de um mapa de medos
a cruzar imagens para definir a estrutura da memória

maria sousa

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15.3.12



quero rodar o mundo na palma da minha mão/ quero um expectador que se encante com meus giros e aplauda meu querer/ quero voar tropeçando em sentimentos me alimentando de desejos/ quero descalça de medos cair em seus braços e gritar sem lamentar não ter feito

Márcia(Clarinha)

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14.3.12



Deixa-me enfim.
É a hora em que
o horizonte que fuma,
esconde a sua fronte
sob halo de bruma
Na hora em que o astro gigante
fugindo é escarlate;
As frouxas plantações
são ouro na colina,
Dir-se-ia que,
quando o outono declina,
o sol e a chuva quase
enferrujam a mata.

Victor Hugo

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13.3.12



doem-me os vazios nas palmas das mãos

o toque das palavras usadas
só no silêncio das papoilas se ouve

como descrever o perfil do vermelho com o olhar vazio

Maria Sousa

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12.3.12



Aceito-me como sou

A escuridão fecha-se como um muro
e não há portas de entrada ou de saída.

Quem pensa em mim agora?

Josep M. Rodriguez

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10.3.12



Faltas-me

Faltas-me. Se aqui estivesses isto não seriam
palavras. Um trinco por dentro, essa ilusão
de voltar a ti olhando os papéis, desconheço
o que de mim resta quando as horas quase trazem
o silêncio e a boca se abre, faz a passagem
do teu corpo a um corpo que aproveita
a substituição que não sabe. Mudaremos o tempo
para nenhuma exigência, faltas-me quando estás
a caminho, já oiço os teus passos subindo
no fundo da escada. Amanhece. Nos sonhos
que não sou capaz de lembrar vens tocar-me
nos ombros e dizer ainda não são horas, ainda
não é alba. As palavras faltam-me, vou
calar-me nas duas voltas da chave, este papel
apagado, sujo da ausência dos teus gestos.

Helder Moura Pereira

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7.3.12



(...)

É delicado o teu rosto, as borboletas
desenham os traços imponderáveis
trazem as neblinas e os véus
que hão-de cobrir-te na intimidade (...)

António Vilhena

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6.3.12



Oscilação

A cada oscilar do pêndulo
algo se apaga
ou para nós termina.

De segundo em segundo,
algo germina
ou para nós floresce.

Helena Kolody

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4.3.12



As folhas se amontoam
no canto do muro.

Os anos se amontoam
no canto da vida.

Vida afora, amontôo
desafinações
em grandes toadas.

Só...

Quero uma toalha úmida,
como telhas depois da chuva.
E fria, como bonecos de neve.

Para, às quedas,
cobrir meu desespero
inteiro e nu.

Jairo De Britto

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3.3.12



Soneto da saudade

A saudade me invade e faz ninho.
Me acompanha pelo caminho
Dorme ao meu lado na cama.
Desperta comigo e clama.

Chama seu nome
Grita seu corpo
Implora sua essência
Chora sua presença.

E se cala num instante
Quando encontra os braços teus
E assim de desfaz.

Se dissipa no ar
E só o que fica
É a vontade de amar.

Carolina Salcides

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2.3.12



Deita-te aqui comigo de olhos fechados
e de palavras ancoradas
quero que percebas que no mais fundo
e secreto de mim há negrume e silêncio
e como daí - do negrume e do silêncio -
podem nascer as cores e renovar-se a alma
basta que
te deites aqui comigo resumindo a noite
como quando se dorme.

Cláudia Caetano

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1.3.12



Hoje
(meu desejo de Aniversário)

Hoje eu quero estar em paz...

E se eu tiver que pensar
que seja o amor
a ocupar meu pensamento
Se eu tiver que falar
que sejam palavras de amor
a descrever o meu momento...

Porque hoje
eu quero estar em paz

e se eu tiver que chorar
que seja de alegria
se eu tiver que perder
que seja o medo da vida
e se eu tiver que sentir
que seja o amor que emana de você

Sim, hoje eu quero estar em paz

quero risos de contentamento
quero beijos delicados
ao sabor do vento
quero música suave
e se uma graça me for outorgada
que seja eu, para sempre, a sua amada...

Ariadna Garibaldi

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