"A todos os visitantes de passagem por esse meu mundo em preto e branco lhes desejo um bom entretenimento, seja através de textos com alto teor poético, através das fotos de musas que emprestam suas belezas para compor esse espaço ou das notas da canção fascinante de Edith Piaf... Que nem vejam passar o tempo e que voltem nem que seja por um momento!"

30.11.16


Sobre espelhos

Em menino, eu tinha medo dos espelhos. O meu temor era que a imagem reflectida se movesse sozinha ou, por exemplo, que o meu corpo fizesse coisas que eu não lhe ordenava. (…) Deste temor insuperável a cegueira libertou-me. 

 Não me agradam nada ou agradam-me demais. Agora, claro, livrei-me deles. Porque a cegueira é um modo drástico de apagar os espelhos. 

  Jorge Luís Borges
(photo Buster Keaton)

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29.11.16


Restaurante 

Leva-me outra vez para a mesma mesa
onde fico de costas para a janela
onde o tempo me esquece
onde nada me toca
o teu gesto protege
o teu corpo separa
a água que me dás
interrompe a memória

Só à porta da rua
o tempo reaparece.

Yvette Centeno
(photo Fred MacMurray and Carole Lombard)

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28.11.16


Os dias normais

Chegam
e vão-se
sem deixar rasto,
e tu ficas a vê-los
a afastarem-se sobre os telhados
- e com eles, os anos -
e apenas sentes nada
ou sentes algo, vago,
que não sabes
decifrar.

São os dias
normais, os de sempre,
os que parece que passam
à distância,

os assassinos
do amor.

 Karmelo C. Iribarren
(photo Jean-Paul Belmondo)

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11.11.16


Classificar 

 Avento farinhas de mesmos sacos, desfaço o bolo ainda quente, minhas mãos crispam a forma na fornalha da ignorância: não aprendo a lição da humanidade no esforço de me lançar ao centro da controvérsia; sou o resumo do jornal de domingo em cadernos imensuráveis; talvez me anuncie em econômicos classificados: terça-feira estou ofertado ao nada. Compareçam.

  Pedro Du Bois
(photo James Dean)

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9.11.16


Vida é caleidoscópio. 
De nada adianta girarmos o cilindro devagar. 
Tanto cuidado para quê? 
Quando menos esperamos os cacos de vidro desabam uns nos outros e formam o imprevisível desenho. 

  Francisco Azevedo 
(photo Audrey Hepburn)

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8.11.16


3x4

Passar a limpo os cinco sentidos. 
Apagar com sono e borracha
 para usar -todos- 
 novos em folha
 de novo: 
 sem luvas, óculos, fones, 
 perfumes de meio ambiente 
 e com a boca livre de lembranças. 

  Armando Freitas Filho
(photo Gene Tierney)

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5.11.16


Sempre-viva

Quando nasci tive sete irmãos 
Enquanto vivi sete amores 
 Ao longo do caminho carreguei sete chaves 
E abri sete portas 
Quando chegar a hora, morrei como quem teve sete vidas.

  Beth Ameida
(photo Claudia Cardinale)

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4.11.16


Desejo-te Tempo 

Não te desejo todos os bens do mundo,
Apenas te desejo aquilo de que gosto mais:
Desejo-te tempo – para sorrires, para rires.
Usa-o bem – podes vir a conseguir.

Desejo-te tempo para acções e pensamentos,
Não só para ti, mas também para os outros.
Desejo-te tempo, não para pressas e correrias,
Mas para te instalares, ai, onde pertences acima de tudo.

Desejo-te tempo, não para esbanjares,
Mas para teres e conservares, deixando algum de sobra
Para te emocionares perante a vida, para confiares no seu curso,
Em vez de seguires o ritmo inflexível das horas.

Desejo-te tempo para alcançares as estrelas
E tempo para cresceres, para seres quem és.
Desejo-te tempo para esperanças novas, para amares de novo.
Pois não adianta deixar esse tempo para depois.

Desejo-te tempo para te encontrares,
Para encher cada dia, cada hora, de alegria.
Desejo-te tempo para esqueceres o que precisas.
Desejo-te: tempo para viveres!

  Elli Michler 
(photo Maude Fealy)

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